Ao Vice-Presidente
Conselho Regional de Medicina de São Paulo
Doutor Mauro Aranha
C/C:Presidente do Cremesp, Doutor Bráulio Luna Filho
Surpreende em sua resposta, doutor Mauro Aranha, logo no primeiro parágrafo, a ênfase ao “interesse legítimo de todos os brasileiros, envolvidos, ou não ,com o tema, descriminalização do porte por usuários de drogas”. Como especialistas, conhecemos os dois lados desta preocupante questão de saúde pública: dependentes e suas famílias. E com a experiência de atendimento a mais de cem mil casos, podemos afirmar que liberar o porte só interessa a usuários para manter o uso e a traficantes para aumentar os lucros. Portanto, não concordamos com sua afirmação de que o tema interessa “a todos os brasileiros”. Que brasileiros são esses, doutor Mauro Aranha?
Em nome das famílias que sofrem as graves consequências quando filhos usam drogas,podemos afirmar que o evento organizado pelo senhor, como vice- presidente do CREMESP, é por demais tendencioso para receber qualquer consideração da parte científica ou da população geral e, em especial, dos familiares dos dependentes químicos. Se não chega a ser a posição oficial do CREMESP é, no mínimo, divulgação desproporcionada de um debate minimamente balanceado sobre o tema.
Lembramos que o CREMESP ESTÁ OMISSO TOTALMENTE em discutir o impacto em termos de saúde pública do uso de álcool e outras drogas. Em relação a maconha, em especial, a omissão chega a ser escancarada pois em nenhum momento houve menção do quanto a maconha produz danos nos usuários e em suas famílias.
Quando o senhor argumenta que “ não me consta que o Cremesp não tenha autonomia, em face do Conselho Federal de Medicina, para promover o debate de temas que se refiram direta ou indiretamente à Medicina ou a políticas de Saúde Pública”, questionamos: por que ao Cremesp só interessa discutir a descriminalização? Nunca vimos o mesmo interesse para esclarecer à população sobre as graves consequências da maconha para quem usa e para sua família.
Lamentamos, portanto, ver o CREMESP, instituição que deveria servir como guia na saúde se comportar como um grupo ideológico e defendendo os interesses de poucos ao invés de defender a saúde.
Psiquiatra Ronaldo Laranjeira, Coordenador da UNIAD – Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas e Investigador Principal do INPAD – Instituto Nacional de Pesquisa em Álcool e Drogas
Miguel Tortorelli, vice-presidente da Federação do Amor-Exigente
Advogado Cid Vieira de Souza Filho, presidente da Comissão Antidrogas da OAB/SP
Senhores:
A plenária temática de amanhã no Cremesp trata do tema específico “Descriminalização do porte por usuários de cannabis” em seus aspectos e desdobramentos médicos (psiquiátricos e políticas de saúde pública), jurídicos, antropológicos e sociológicos, e que, portanto, ultrapassam o campo estrito apenas da Medicina e envolve o interesse legítimo de todas as discilpinas e todos os brasileiros, de uma forma ou outra envolvidas com o tema.
Além disso, não me consta, como os senhores procuram deixar subentendido, que o Cremesp não tenha autonomia, em face do Conselho Federal de Medicina, para promover o debate de temas que se refiram direta ou indiretamente à Medicina ou a políticas de Saúde Pública. Ainda mais, que se trata de um debate e não de uma defesa de qualquer posicionamento que o Cremesp, como colegiado, em sua plenária de conselheiros, tenha nesse momento. Alíás, não o tem. O Conselho quer ouvir, com liberdade de escuta e de expressão, o que tantos outros estudiosos do tema têm a nos dizer. O debate me parece oportuno, importante e constitucional, haja vista, estar em trâmite no próprio Supremo Tribunal Federal.
Gostaria também de lembrá-los, entre outros equívocos do conteúdo de vossa missiva, que o Cremesp publicou sua Resolução sobre o uso do canabidiol em consonância com o sofrimento de mães e de crianças, estas vitimadas por epilepsia refratária a drogas convencionais, e em consonância com a Anvisa que, já antes da Resolução, permitia o uso restrito e compassivo de drogas, com certo grau de confiabilidade quanto ao binômio eficácia/toxicidade, em doenças graves e refratárias a tratamento convencional. Além disso, o canabidiol é um canabinóide diverso do THC, diferentemente do que consta em vossa missiva.
Aproveito a oportunidade para convidá-los à plenária de amanhã, contando, é certo, com vossa contribuição construtiva para ampliar e qualificar ainda mais o referido debate.
Atenciosamente,
Mauro Aranha de Lima
vice-presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo