A luta do jogador Régis contra a dependência química

by Thiago Biancheti

“Se tivesse noção do quanto isso ia me custar, não teria nem experimentado”.

“Olhei ao meu redor e achei que ia morrer”. A frase, dita em um trecho da entrevista concedida ao GloboEsporte.com, resume parte do que Régis passou nos últimos três anos, resultado da combinação de álcool, drogas e depressão.

Aos 29 anos, o lateral do São Bento está em uma casa de reabilitação de Sorocaba, interior de São Paulo, onde busca recomeçar a vida. As três prisões, a dispensa do São Paulo e uma série de problemas pessoais foram o estopim para que o jogador buscasse tratamento contra o álcool e a cocaína.

A lucidez com que Régis fala do vício talvez seja o sinal de que o jogador, o pai, o ser humano cansou de ser derrotado. Mas, para contarmos o motivo que levou o GloboEsporte.com a entrevistar um jogador de futebol em uma casa de reabilitação para dependentes químicos, precisamos voltar ao ano de 2015.

Foi quando recebia salário mesmo sem atuar pelo RB Brasil – o clube não tinha calendário no segundo semestre – que Régis teve o primeiro contato com a cocaína. Aos 25 anos, o jogador experimentaria pela primeira vez algo que mudaria por completo a sua vida. Negativamente.

Antes disso, porém, veio o álcool.

O álcool começou com 18, 19 anos, quando estava na base e comecei a ganhar dinheiro com o primeiro contrato. Era vaidade, algo para se autoafirmar. Se tivesse noção do quanto isso ia me custar, não teria nem experimentado – relembra.

Entre o primeiro contato com a cocaína e o uso contínuo desde então, Régis seguiu a carreira passando por São Bento, Luverdense, Guarani e Bahia.

O talento dentro de campo se sobressaía ao uso de drogas fora dele. Em 2018 Régis realizou o grande sonho da carreira: vestir a camisa de um grande clube do futebol brasileiro. Após fazer um excelente Paulistão pelo São Bento, em sua até então terceira passagem pelo clube, o lateral foi contratado pelo São Paulo em março de 2018.

Tive alguns problemas, mas nada que tenha tomado uma grande proporção. Encarava como algo leve, não entendia que estava caminhando para uma dependência. No São Paulo que percebi que estava tendo um problema com álcool e drogas – explica.

Cheguei no São Paulo com sete meses de abstinência e eles sabiam de alguns episódios que tinham acontecido. Todo aquele glamour, sucesso… e eu acabei saindo do foco. Tive minha primeira recaída. Eles montaram um plano de recuperação, voltei a jogar e bem, mas tive outra recaída e eles não tiveram mais como me manter no elenco – conta.

Demorou um tempo para eu cair na realidade depois que saí do São Paulo. Foi uma situação traumática. Acho que entrei em depressão – explica Régis.

Menos de sete meses após ser apresentado, Régis foi dispensado pelo São Paulo. No período, o jogador ficou afastado por dois meses para tratamento, mas a nova recaída fez o clube optar pelo encerramento do contrato. Junto com o término do vínculo com o Tricolor, chegou a depressão e novos problemas pessoais.

Eles me ligaram. O Raí pediu para eu descansar e disse que estava insustentável minha manutenção no elenco. Não queria acreditar que tinha jogado fora a maior oportunidade da minha vida. Fiquei de setembro a dezembro sem poder atuar. Enfiei o pé na lama, me perdi nas festas e coloquei na cabeça que tinha que me entregar. Acabei sendo preso, fui ao CSA totalmente desestruturado. Isso gerou uma nova recaída. Não foi o mais grave, mas abriu meus olhos.

O que fez Régis pedir ajuda foi a terceira prisão em menos de 90 dias, em Sorocaba, por embriaguez ao volante, posse de drogas e resistência à prisão. Antes disso, o jogador foi detido acusado de tentar invadir um apartamento no Distrito Federal. No fim de fevereiro, Régis voltou a ser preso após confusão em um motel de Maceió. A confusão, inclusive, foi determinante para ele ser dispensado do CSA, clube que havia aberto as portas após deixar o São Paulo e onde vinha tendo boas atuações.

Lembro que eles me abordaram no posto, me prenderam e levaram até a delegacia. Não me alimentava há dois dias. Foi o momento que me dei conta que era um dependente químico. O episódio foi muito traumático, olhei ao meu redor e achava que ia morrer. Não estava mais tendo controle da minha situação. Aceitei porque entendi que precisava de ajuda. Quando encarei minha realidade, entendi que precisava me tratar porque era dependente de álcool e drogas – revela.

A primeira perda foi a minha identidade. Não me conhecia mais, me tornei uma pessoa ansiosa e agressiva. Perdi a oportunidade da minha vida no São Paulo – descreve Régis.

Régis chegou à delegacia em situação precária. Sujo, com as roupas rasgadas e sem consciência do motivo que o levara a estar preso.

O carro, apreendido pela polícia, havia sido comprado e entregue um dia antes. Avaliado em mais de R$ 120 mil, nem de longe parecia recém-saído da loja. Imundo e amassado, o descaso com o bem material ficava em segundo plano diante da deterioração do ser humano.

Mesmo em condições sub-humanas – pelo efeito de álcool e cocaína -, o jogador foi reconhecido por torcedores do São Bento. A situação não deixou apenas quem passava pelo local assustado. O próprio lateral resume como “traumática” a experiência de ter visto de perto a morte, e que a abordagem policial pode ter salvado a sua vida.

Desde então, Régis passa por um período de reflexão e processo de desintoxicação em uma casa de reabilitação para dependentes químicos em Sorocaba. O momento é outro: cama arrumada, roupas limpas, refeições à mesa e a dignidade de volta. Já são mais de 15 dias de um tratamento que não tem previsão para acabar.

Aceitar uma internação não é fácil, isso mostra que desejo me restabelecer. Quero provar que posso voltar. Passo a passo, dia a dia vou conquistar essa confiança. Vou voltar a jogar e espero ter o mesmo desempenho ou ainda melhor – projeta.

Todas as atividades de Régis têm acompanhamento de um profissional da casa de reabilitação ou de um funcionário do São Bento. A rotina do jogador se resume basicamente a sessões terapêuticas, cultos e atividades com outros pacientes.

Meu filho viu na internet uma matéria e perguntou se o pai tinha sido preso. Ele falou de uma forma madura como se tivesse compreendido que o pai dele precisava de ajuda – relembra Régis.

No estágio inicial do programa de reabilitação, Régis tem dormido na casa e só tem contato externo quando vai aos treinos do São Bento – atividade diária -, ou sai para tomar café em alguma padaria, programa preferido do jogador, além de tocar violão e comandar os cultos no local.

O Régis precisa restabelecer a vida e a carreira dele. O primeiro estágio da dependência química é a intoxicação, então estamos no processo de desintoxicação. Ele tem a vantagem de ser um atleta de alto nível, esse processo está praticamente sendo vencido. O Régis e o clube estão contentes com o resultados. O tempo que ele irá permanecer em tratamento não sabemos. Depende de questões emocionais, sucesso e o tempo que vai durar o tratamento é dele, a resposta é só dele – explica Beto Maia, diretor terapêutico.

Enquanto busca retomar a vida e a rotina de atleta sem vícios, Régis segue treinando normalmente com o elenco do São Bento, que se prepara para a disputa da Série B do Brasileiro. Sem estipular qualquer data ou previsão, o clube conta com o jogador para o restante da temporada. E o próprio lateral demonstra otimismo com relação ao futuro.

Meu sonho é me restabelecer como pessoa, atleta e retribuir tudo o que o São Bento tem feito por mim. Quero voltar a uma grande equipe. Para alguns pode parecer impossível, mas na posição que jogo acho que posso ter uma passagem pela seleção brasileira – planeja.

Leia a matéria completa no site do GloboEsporte.com.

Você pode se interessar também por:

Leave a Comment

×